Durante a tarde do primeiro dia do Seminário da Abruem foi realizado o debate Desafio do Ensino Remoto Emergencial no Ensino Superior. A coordenação ficou a cargo do presidente da Câmara de EaD da Abruem, professor Dilmar Baretta.
Como palestrantes participaram o professor associado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carlos Eduardo Bielschwsky, o reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Marcelo Knobel, e o ex-presidente da Abruem e reitor da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Antonio Guedes Rangel.
Segundo Carlos Eduardo Bielschwsky, a educação à distância é um conhecimento que está sendo desenvolvido há anos: começou com o ensino por correspondência em 1728 nos Estados Unidos, passando pela entrada das tecnologias do rádio, tv, seguido das criação das grandes universidade de EaD.
Durante sua apresentação, o reitor apresentou dados sobre a oferta e qualidade do ensino à distância no Brasil, bem como os problemas que essa modalidade de ensino tem vivido ao longo dos anos. "A EaD vem tendo problemas no Brasil há alguns anos com a inconstância no financiamento da UAB", explica ao destacar a cartelização do ensino à distância no setor privado por poucos grupos educacionais e com fortes indícios de precarização.
O professor apresenta um dado, segundo ele bastante preocupante, de que 10 grupos privados detêm 25,1% da educação presencial no Brasil e 75,4% da EaD, sendo responsável por quase 40% de todo o ensino superior do País. Ele destaca ainda resultados ruins do Enade de alguns dos cursos de EaD oferecidos por esses grupos e, em contraposição, resultados ótimos do Enade de cursos públicos de ensino à distância oferecidos, por exemplo, pelo consórcio Cederj, do Rio de Janeiro.
"O problema não é a metodologia de EaD, mas a cartelização do ensino superior no Brasil utilizando a EaD".
Pandemia
Quando se trata de pandemia, Carlos Eduardo ressalta que muitas Instituições de Ensino Superior (IES) estão se empenhando fortemente em vencer este difícil momento e que, no País, falta uma ampla cultura de utilização de tecnologias da informação e da comunicação no ensino presencial, com rejeições às vezes. "O desafio é termos clareza da importância dessas tecnologias e de trabalharmos com elas".
O professor explica que a docência no espaço virtual requer mudanças e que muitos docentes ainda têm dificuldades em aceitarem as mudanças. "O papel das nossas instituições na capacitação do professor é fundamental. E, passada a pandemia, não podemos nos esquecer de continuar o esforço de implementar esses processos que deixarão marcas significativas no futuro", orienta.
Ao final ele deixa duas provocações: vamos encontrar mecanismos que alavanquem a EaD nas instituições públicas e ajudem a disseminar a tecnologia, além de contribuir para a inclusão social no ensino superior? O que ficará de inovação no processo de ensino e aprendizagem no pós-pandemia?
Desigualdades
Durante sua explanação, o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel, explicou que a desigualdade criada pela pandemia se misturou à desigualdade social já existente no País e que isso se refletiu nas universidades. Ele citou, como exemplo, o caso de centenas de alunos que não possuíam conexão de internet para assistir às aulas mediadas por tecnologia, que não possuíam um local adequado em casa para estudar.
"A verdade é que tínhamos essas desigualdades, apresentadas de formas diferentes, mesmo antes da pandemia começar, com alguns alunos tendo dificuldades imensas até de acesso aos campi, por exemplo". Neste sentido, o reitor ressalta que se as universidades souberem aproveitar o melhor do ensino remoto e do presencial, pode-se conseguir trabalhar o equilíbrio para ajudar alguns estudantes. "As possibilidades com ensino remoto são infinitas e não foram exploradas antes".
Um exemplo, segundo ele, é a realização do Seminário de forma virtual que gerou uma economia de dezenas de milhares de reais. "Perdemos as interações sociais, que são fundamentais, mas conseguimos realizar o evento", reitera.
O reitor destaca que um dos principais desafios deste tempo de pandemia tem sido planejar um futuro sem se ter ao menos ideia de como ele será. "Temos que planejar as aulas sem nem sabermos como será o vestibular ou o Enem. São muitas variáveis que não temos nem ideia de como vai acontecer", aponta.
Outro desafio importante levantado é a questão da permanência estudantil que, neste momento, tem atingido mais universidades particulares, no entanto, também deve chegar às públicas. De acordo com o reitor, para essa e várias outras questões, tem ideias e não respostas.
Ele relata que, quando a pandemia passar, "poderemos encontrar um caminho interessante e buscar atualizar as nossas práticas a partir das situações que estamos vivendo".
Desafios
A pandemia da covid-19 expôs fragilidades e impôs desafios inúmeros às IES. Durante sua fala, o ex-presidente da Abruem e reitor da Universidade Estadual da Paraíba, Antonio Guedes Rangel, elencou algumas categorias de desafios que estão sendo enfrentados pelas universidades.
O primeiro foi nomeado como experiencial/ existencial. De acordo com o reitor, a negação da pandemia foi a pior estratégia que as pessoas poderiam ter tido diante do contexto que estamos vivendo. "Quem tentou fazer isso conseguiu arrumar um problema para si e para os outros. O mais grave de tudo isso é quando essa negação passa a ser feita por parte de agentes públicos", destaca.
"Para mim, o maior desafio é esse experiencial, como ressignificar aspectos importantes da nossa existência diante de um desafio de algo que era, de fato, completamente desconhecido".
O segundo desafio, segundo o reitor, é o psicológico. "Já trazendo para o âmbito da educação superior propriamente dita, tivemos que compreender que estávamos, de fato, diante de uma novidade e não tínhamos alternativas a não ser enfrentar a situação", destaca ao relatar a experiência da UEPB.
Para Antonio Rangel, ao desafio psicológico foi agregado um novo, o cognitivo. "Neste sentido buscamos assegurar que as pessoas compreendessem que estando diante de uma situação completamente nova e que prometia ser duradoura, precisavam se desafiar a um conhecimento novo. E é nisso que continuamos acreditando, que a pandemia desafiou a todos, todos os setores tiveram que buscar alternativas".
Outro desafio para o qual as universidades não estavam prontas, de acordo com o reitor, é o econômico/ financeiro. Neste sentido, ele destaca que as instituições públicas não estavam preparadas financeiramente para o enfrentamento de tão grande monta para garantir as condições materiais para que o enfrentamento à pandemia fosse feito, tanto do ponto de vista das condições de equipamentos, quanto da garantia do acesso das pessoas à internet.
O reitor ainda acrescenta à lista o desafio acadêmico/ educacional, que, de acordo com ele, era não permitir que algumas IES ficassem paradas no tempo e outras avançando muito mais, mas criar um jeito que permitisse que a educação como um todo no País pudesse avançar.
"As instituições de um modo geral encararam isso, buscando criar condições para que os estudantes pudessem continuar avançando em seus estudos", relatou.
Como último desafio, Antonio Rangel destaca o histórico. "A pandemia tem sido e está sendo um desafio histórico. Foi, num primeiro momento, de ruptura, de desconstrução de novas aprendizagens, de ressignificação do nosso saber fazer acadêmico e profissional. E foi enfrentada com um sentimento de que qualquer coisa precisava ser feita. Só uma coisa poderia ser negada, na minha leitura, era a possibilidade de ficarmos sem fazer nada".